Os dois lados de Cancún
22/12/2010
Virgilio Viana*
Podemos dizer que ocorreram dois grandes eventos em Cancún. O primeiro foi a Conferência das Partes (COP), que tratou das negociações sobre o futuro da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Este é o evento “oficial” da Convenção e ocorre anualmente. Os resultados foram tímidos diante da urgência e gravidade do problema. Nenhuma surpresa positiva, infelizmente.
O outro evento poderia ser chamado de “Conferência Global sobre Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Sustentável”. Foram centenas de congressos, simpósios, oficinas e reuniões de trabalho, que ocorreram nos excelentes centros de convenção e hotéis espalhados por toda Cancún. Formalmente, estes são conhecidos como “eventos paralelos” da COP.
Ao contrário do evento oficial, os eventos paralelos foram um enorme sucesso. Nestes pode-se observar o dinamismo e potencial inovador de governos nacionais e sub-nacionais (estados e municípios), empresas, movimentos sociais, ONGs, instituições de pesquisa e líderes independentes. Foram apresentadas inovações tecnológicas de todos os tipos, por empresas e pesquisadores. Lideranças locais, regionais e globais debateram temas complexos, com a profundidade necessária e sem as amarras dos formalismos das negociações oficiais. Foram relatadas experiências inovadoras tanto por governos quanto por empresas e ONGs.
Notícias boas vieram de lugares como a Indonésia, que lançou uma ambiciosa iniciativa de redução do desmatamento e mudança do seu paradigma de desenvolvimento no rumo de uma economia verde. Sistemas de certificação de florestas tiveram grandes avanços e superaram problemas metodológicos estratégicos. Grandes empresas globais aderiram a pactos setoriais para rastrear seus fornecedores e diminuir suas pegadas de carbono. ONGs apresentaram soluções inovadoras para combinar redução da pobreza com conservação da natureza. Investidores se mostraram mais abertos para apostar em negócios verdes. Agências multilaterais começaram a mostrar alguns resultados animadores. Parcerias sul-sul se tornaram uma nova fonte de esperança e otimismo. Novas alianças e parcerias vêm quebrando paradigmas, sectarismos e velhos preconceitos. Existe uma nova concertacion global em curso.
A mensagem dos eventos paralelos é de que foi tomada a decisão de agir, já, apesar dos resultados das negociações oficiais das últimas COP terem sido desanimadores. Talvez este desânimo com o processo oficial tenha se convertido em ânimo para aqueles que são mais vulneráveis ao sentimento de urgência dos problemas climático, social e ambiental; à pressão da sociedade civil e que possuem maior capacidade de vislumbrar oportunidades econômicas. De agora em diante, devemos prestar mais atenção nos resultados da “Conferência Global sobre Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Sustentável”. As próximas serão na África do Sul, no final de 2011, e no Rio de Janeiro, em 2012. Serão oportunidades estratégicas para o Brasil demonstrar liderança por ações práticas, ousadas e inovadoras rumo a uma economia verde.
* – Engenheiro Florestal pela ESALQ, Ph.D. pela Universidade de Harvard, ex-Secretário de Meio Ambiente de Desenvolvimento Sustentável do Amazonas e Superintendente Geral da Fundação Amazonas Sustentável.