Existe espaço para reduzir a burocracia e aumentar a agilidade sem perder o rigor.
O licenciamento ambiental é, desde a criação da Política Nacional de Meio Ambiente, um dos principais instrumentos para garantir que atividades econômicas sejam compatíveis com a conservação dos recursos naturais e a qualidade de vida. Trata-se de uma ferramenta de gestão ambiental que precisa ser constantemente aperfeiçoada.
Com a aprovação, pelo Congresso, do Projeto de Lei Geral do Licenciamento Ambiental (PL 2.159/2021) — apelidado por muitos de “PL da Devastação” — o país voltou a debater intensamente esse tema. O texto traz riscos significativos de retrocesso, como a ampliação de exceções para atividades potencialmente poluidoras, o uso indiscriminado da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para empreendimentos de médio impacto e o esvaziamento de espaços colegiados como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
Entretanto, é importante observar a necessidade de aprimorar tanto a legislação quanto o processo de licenciamento dos órgãos ambientais. Existe espaço para reduzir a burocracia e aumentar a agilidade sem perder o rigor. Houve um processo de “cartorialização” do processo de licenciamento ambiental que resulta num excesso de documentos de outras instituições e pouco dizem respeito à análise dos riscos ambientais e medidas mitigadoras. Existe aí um grande espaço para melhoria.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, já afirmou que “não basta vetar, é preciso colocar algo no lugar”, sinalizando que o governo pretende seguir apresentando novas medidas para modernizar o sistema. Esse é um ponto central: não se trata de manter o status quo, mas de aperfeiçoar um instrumento essencial. Como lembrou o ex-ministro José Carlos Carvalho, a principal causa da morosidade não está no excesso de rigor, mas no sucateamento do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama) e do Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos. Falta pessoal, orçamento, tecnologia e apoio político para que os órgãos ambientais cumpram sua função.
Aperfeiçoar o licenciamento implica reconhecer que a estrutura atual está longe do ideal, mas entender que a saída não é desestruturar o sistema. É legítimo ouvir críticas à burocracia e à cartorialização, mas mudanças precisam preservar a finalidade central: evitar danos irreversíveis ao meio ambiente. Isso exige um processo contínuo de melhorias, como uso de tecnologias de monitoramento em tempo real, qualificação das equipes técnicas e fortalecimento institucional. Sem enfrentar o sucateamento dos órgãos ambientais, qualquer promessa de agilidade será ilusória.
Modernizar o licenciamento é possível e necessário. Isso inclui retomar instrumentos como a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), que permite avaliar impactos já na fase de planejamento de grandes obras, evitando que decisões sejam tomadas sem considerar plenamente os custos ambientais. É preciso também vincular o licenciamento a metas de qualidade ambiental por bacia hidrográfica, analisando impactos cumulativos e não apenas empreendimentos isolados. E adotar ritos diferenciados conforme o porte e o potencial de impacto: empreendimentos de baixo risco podem ter processos simplificados, desde que acompanhados por fiscalização efetiva e com responsabilização clara.
Desestruturar, por outro lado, significa reduzir a participação social, ignorar decisões do Supremo Tribunal Federal e enfraquecer instâncias como o Conama. É abrir espaço para insegurança jurídica e aumentar riscos ambientais, como desmatamento, degradação de rios e perda de biodiversidade. Também é ignorar que muitos municípios — quase metade com menos de 10 mil habitantes — não têm capacidade técnica para licenciar de forma adequada. Nesse cenário, é fundamental criar arranjos intermunicipais e fortalecer a gestão compartilhada.
O licenciamento não decide sozinho se uma obra será realizada, muitas vezes a decisão já foi tomada por instâncias setoriais, mas ele tem o papel crucial de impedir que empreendimentos inviáveis avancem. É um filtro essencial contra o desenvolvimento predatório, que transfere prejuízos ambientais para toda a sociedade.
Às vésperas da COP30, o Brasil tem a oportunidade de mostrar que pode conciliar desenvolvimento e conservação. Isso não se faz com atalhos que sacrificam o meio ambiente em nome de uma agilidade perigosa. Precisamos de fortalecimento das instituições responsáveis pela gestão ambiental, fortalecendo suas capacidades técnicas e operacionais. É essencial ver a gestão ambiental como um pilar essencial para a prosperidade do Brasil. Só seremos um país próspero se despoluirmos nossas águas, recuperarmos as florestas de nossas nascentes e cuidar da nossa rica biodiversidade. Aperfeiçoar significa modernizar, fortalecer e tornar mais eficiente; desestruturar é abrir mão disso e retroceder. E retrocesso, em tempos de crise climática e emergência ecológica, é um caminho que não devemos percorrer.
Publicado originalmente no site Um Só Planeta, em 29/09/2025
Créditos de imagem: Fernando Frazão/Agência Brasil



